Guarne: oásis verde pertinho de Medellín
Guarne: oásis verde pertinho de Medellín
Descobri este paraíso por acaso numa sexta-feira chuvosa
Estava a rolar o Instagram numa sexta-feira de março de 2024, farto do barulho constante de Medellín, quando vi uma foto que me fez parar. Era uma cascata rodeada de verde intenso, com uma legenda simples: “Guarne, 45 minutos de Medellín”. O meu primeiro pensamento foi: “Mais um filtro exagerado do Instagram”. Mas algo naquela imagem me chamou a atenção – talvez fosse a forma como a luz batia na água, ou a composição natural da foto que o meu olho de fotógrafo amador conseguiu captar.
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Não podia estar mais enganado sobre o filtro.
Três dias depois, numa segunda-feira que acordei às 6h30 da manhã (coisa rara para mim), estava num autocarro a caminho de Guarne. Tinha passado o fim de semana a pesquisar sobre este lugar que, estranhamente, quase ninguém menciona quando fala de turismo ecológico na Colômbia. A maioria das pessoas só conhece Medellín, Cartagena, talvez Bogotá… mas Guarne? Praticamente um segredo bem guardado.
A primeira coisa que notei quando saí do autocarro foi o silêncio. Não é que fosse completamente silencioso – havia pássaros, vento nas árvores, água corrente ao longe – mas a ausência daquele ruído urbano constante foi como tirar uns auscultadores que nem sabia que tinha postos. Respirei fundo e senti literalmente o ar mais limpo a entrar nos pulmões. A diferença de temperatura também era óbvia: uns bons 5 graus mais fresco que Medellín, graças aos 2.150 metros de altitude.
O que mais me surpreendeu foi descobrir que quase não tinha sinal de telemóvel no primeiro mirador onde fui. Inicialmente fiquei ansioso – como é que ia postar no Instagram? Como ia usar o GPS? Mas depois de uns minutos, essa ansiedade transformou-se numa sensação de liberdade que não sentia há anos. Quando foi a última vez que estiveste completamente desconectado, mesmo que por algumas horas?
Guarne não é apenas “mais um pueblo típico colombiano”. É um exemplo vivo de como o turismo ecológico pode funcionar sem ser forçado ou artificial. Aqui, a sustentabilidade não é uma palavra da moda colada numa placa – é uma forma de vida que se sente em cada quinta orgânica, em cada trilho cuidadosamente mantido, em cada local que te explica com orgulho como estão a proteger a biodiversidade da região.
Como chegar a Guarne sem stress (e sem gastar uma fortuna)
Vou ser honesto: a primeira vez que fui a Guarne foi um pequeno desastre logístico. O GPS do Uber ficou completamente maluco – aparentemente há duas estradas principais para lá e o sistema não sabia qual escolher. Acabámos por fazer um desvio de 20 minutos que, ironicamente, revelou-se mais bonito que a rota original. Às vezes os erros resultam nas melhores descobertas.
Guarne fica a cerca de 45 quilómetros a nordeste de Medellín, numa localização estratégica que permite escapar ao caos urbano sem se afastar demasiado da civilização. A diferença de altitude (de 1.495m em Medellín para 2.150m em Guarne) faz-se sentir não só na temperatura, mas também na qualidade do ar e na vegetação.
Opções de transporte testadas por mim:
O autocarro público sai da estação Caribe em Medellín e custa apenas 6.000 pesos colombianos (cerca de 1,50€). É a opção mais económica, mas prepara-te para uma viagem de hora e meia com várias paragens. Aprendi que é melhor ir de manhã cedo – depois das 10h fica cheio de locais que vão trabalhar nas quintas.

Para quem prefere conforto, Uber ou táxi custam entre 60.000-80.000 pesos (15-20€). Vale a pena dividir com alguém. Uma dica que me custou caro: evita sextas à tarde e domingos para voltar. O trânsito na volta é infernal, especialmente quando há eventos na região.
Se alugares carro, tens liberdade total para explorar, mas cuidado com os fins de semana – os parques de estacionamento ficam lotados e alguns trilhos ficam sobrelotados. A estrada é boa, mas tem algumas curvas apertadas que podem ser desafiadoras se não estás habituado a conduzir em montanha.
Quando ir (aprendi isto da pior forma):
A melhor época é abril-maio e setembro-outubro. Evita novembro-dezembro – fui em plena época de chuvas em novembro de 2023 e foi literalmente um banho de lama. Voltei encharcado, com as botas cheias de barro e sem conseguir tirar uma foto decente. Foi frustrante, mas também me ensinou a respeitar mais o clima da região.
O clima em Guarne muda rapidamente – podes começar o dia com sol e acabar com chuva torrencial. Leva sempre uma capa de chuva e roupa para diferentes temperaturas. Enquanto escrevo isto, acabei de ver no Instagram de um amigo que está lá agora (fevereiro de 2025) e o tempo está perfeito – céu azul e temperatura ideal para caminhadas.
O que torna Guarne verdadeiramente especial
Quando cheguei a Guarne, esperava encontrar “mais umas montanhas verdes” – uma versão menor dos Andes que já tinha visto noutros lugares. Que ingenuidade a minha. A biodiversidade numa área tão pequena é impressionante, quase como se diferentes ecossistemas tivessem decidido fazer uma convenção num só lugar.
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A natureza que não esperava:
Nas primeiras duas horas de caminhada, identifiquei pelo menos seis tipos diferentes de orquídeas nativas. Não sou botânico, mas tenho o olho treinado para detalhes visuais, e a variedade de cores e formas era extraordinária. Algumas só florescem entre março e maio, por isso a época da tua visita pode determinar completamente o que vais ver.
Tentei fotografar um quetzal durante duas horas numa manhã de abril. Duas horas! Só consegui uma foto desfocada que nem vale a pena mostrar, mas aqueles 120 minutos de paciência e observação valeram cada segundo. Há algo sobre esperar silenciosamente na natureza que nos reconecta com um ritmo de vida que esquecemos que existia.
Agricultura que funciona mesmo:
Nem todas as quintas são iguais – algumas são mais “greenwashing” que sustentabilidade real. Aprendi a distinguir as genuínas das que apenas usam a palavra “orgânico” como estratégia de marketing. A Quinta Don Carlos, por exemplo, pratica realmente agricultura orgânica há mais de 15 anos. O proprietário (que se chama Carlos mesmo, não Juan como disse numa conversa anterior – às vezes confundo os nomes) mostrou-me o sistema de compostagem e explicou como mantêm o solo fértil sem químicos.

Os cultivos hidropónicos também me surpreenderam. Nunca tinha visto um sistema tão eficiente de produção de vegetais com tão pouco impacto ambiental. Muitas quintas já aceitam pagamentos digitais, o que facilita muito – não precisas de andar sempre com dinheiro.
Projetos de conservação que funcionam:
O programa de reflorestação com espécies nativas é impressionante. Inicialmente pensei que eram eucaliptos (que são problemáticos para o ecossistema local), mas são espécies locais que ajudam a recuperar o solo degradado pela agricultura intensiva de décadas passadas. Cada árvore plantada tem um propósito específico no ecossistema.
Há também programas de educação ambiental para crianças locais que me tocaram profundamente. Ver miúdos de 8-10 anos a explicar a importância da biodiversidade com um entusiasmo genuíno dá esperança no futuro.
Atividades que realmente valem a pena
Trilho da Cascata El Salto:
Três horas ida e volta, dificuldade média, mas a altitude afeta mesmo. Quase desisti a meio porque estava sem fôlego – não subestimes os 2.150 metros de altitude se vens do nível do mar. O trilho está bem marcado, mas leva água suficiente. Os preços lá em cima são absurdos – uma garrafa de água custa 8.000 pesos (2€) quando em baixo pagas 2.000.
A cascata em si é espetacular, especialmente pela manhã quando a luz bate diretamente na água. Para fotografar bem, recomendo chegar antes das 10h – depois fica muito movimento e a luz não é tão favorável.
Caminho dos Miradores:
Perfeito para quem tem pouco tempo ou não quer fazer grandes esforços físicos. São três miradores diferentes, cada um com uma perspetiva única do vale. Cuidado com a bateria do telemóvel – não há onde carregar e a tentação de tirar fotos é constante.
O segundo mirador tem a melhor vista para o pôr do sol, mas também é onde há menos sinal de telemóvel. Aprendi a levar um power bank sempre, especialmente depois de ficar sem bateria numa tarde e perder algumas fotos que nunca mais consegui repetir.
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Experiências nas quintas:
A Quinta Don Carlos oferece um tour de café com degustação por 35.000 pesos (cerca de 8€) que vale cada cêntimo. Aprendes todo o processo, desde a planta até à chávena, e o café que provei lá foi o melhor que bebi na Colômbia. O proprietário Carlos (agora tenho a certeza do nome) tem uma paixão contagiante pelo seu trabalho.
Na Quinta La Esperanza tive uma experiência inesperada – acabei a plantar alfaces numa manhã de quinta-feira. Nunca pensei que fosse gostar de meter as mãos na terra, mas há algo terapêutico no processo. Voltei com as unhas sujas e um sorriso que não conseguia tirar da cara.
Atividades de aventura (com moderação):
O parapente é para os corajosos, mas só com empresas certificadas. Vi alguns turistas a tentar poupar dinheiro com operadores duvidosos – não vale a pena o risco. As empresas sérias custam entre 150.000-200.000 pesos (35-45€) e incluem seguro e equipamento profissional.
O ciclismo de montanha é mais acessível – aluguer de bicicletas por 40.000 pesos (10€) por dia. Capacete não é opcional, por muito que estrague o penteado. Aprendi isto quando vi um turista alemão a levar um tombo feio numa descida.
Onde comer e dormir sem arruinar o orçamento
Gastronomia local autêntica:
O Restaurante Tierra Verde pratica farm-to-table genuíno – os vegetais vêm literalmente da horta que podes ver pela janela. A trucha grelhada com vegetais da horta (50.000 pesos, cerca de 12€) é extraordinária, mas o serviço é lento. Muito lento. Leva paciência ou um bom livro.
O Café del Pueblo serve o melhor pequeno-almoço tradicional por 20.000 pesos (5€). Pede as arepas de milho roxo – são uma especialidade local que não encontras em Medellín. A textura é diferente e o sabor mais intenso.
Uma dica valiosa: evita os restaurantes na estrada principal – são tourist traps clássicos com preços inflacionados e comida medíocre. O mercado local aos sábados tem fruta fresca por metade do preço dos restaurantes.
Alojamento sustentável:

O Ecolodge Las Nubes (150.000 pesos/noite, cerca de 35€) inclui pequeno-almoço e tem uma vista incrível do vale. Água quente só de manhã, mas a vista da cama compensa qualquer inconveniente. Usam energia solar e têm um sistema de reciclagem de água que realmente funciona.
Para orçamentos mais apertados, o Hostal Verde (60.000 pesos/noite, cerca de 15€) é limpo e bem localizado. Os quartos são básicos mas confortáveis, e a atmosfera é relaxante.
Turismo responsável que faz a diferença
Sigo sempre uma regra simples: levo o meu lixo de volta, especialmente plásticos. Pode parecer óbvio, mas notei mais lixo nos trilhos em 2024 comparado com 2023. Cada visitante tem responsabilidade na preservação deste lugar.
Respeitar os trilhos marcados não é apenas uma sugestão – a erosão é um problema real. Vi áreas onde turistas criaram “atalhos” que resultaram em deslizamentos de terra. Os trilhos oficiais existem por uma razão.
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Uso sempre garrafa reutilizável – há várias fontes de água potável na região e evitas contribuir para o problema do plástico. Algumas quintas oferecem água filtrada gratuitamente se levares a tua própria garrafa.
Apoiar a comunidade local:
Comprar diretamente aos produtores faz diferença real. Comprei café diretamente na Quinta Don Carlos e poupei 40% comparado com os preços em Medellín. Além disso, o dinheiro vai diretamente para quem produz, não para intermediários.
Contratar guias locais certificados não só garante segurança como apoia a economia local. Um guia custa entre 80.000-120.000 pesos (20-30€) por dia e o conhecimento que oferecem sobre flora, fauna e história local vale muito mais que o preço.
Desafios atuais:
A pressão do desenvolvimento urbano é uma preocupação real. Medellín está a crescer e Guarne está na rota de expansão. Acabei de ler que aprovaram novas medidas de proteção ambiental este mês (fevereiro de 2025), mas a implementação é sempre o desafio.

O turismo crescente é uma faca de dois gumes – traz dinheiro e consciencialização, mas também pressão sobre os recursos naturais. Cada visitante consciente pode fazer a diferença entre turismo sustentável e sobre-turismo destrutivo.
Por que Guarne me conquistou (e provavelmente vai conquistar-te também)
Voltei a Guarne quatro vezes desde a primeira visita. Cada vez descubro algo novo – uma espécie de pássaro que não tinha notado, um trilho secundário, uma conversa com um local que me dá uma perspetiva diferente.
O que realmente mudou em mim foi a consciência da importância dos espaços verdes. Não é apenas sobre “natureza bonita” – é sobre ecossistemas funcionais, comunidades que vivem em harmonia com o ambiente, e a possibilidade real de turismo que beneficia em vez de prejudicar.
A tranquilidade que encontrei em Guarne era algo que não sabia que precisava. Vivemos numa era de estímulos constantes, notificações, ruído urbano. Ter algumas horas de silêncio genuíno, ouvindo apenas sons naturais, foi quase terapêutico.
Não tentes fazer tudo num dia – o ritmo aqui é diferente e isso é proposital. Às vezes o melhor plano é não ter plano nenhum. Senta-te num mirador, observa as nuvens a moverem-se sobre as montanhas, ouve os pássaros. Parece cliché, mas funciona.
Traz roupa para diferentes temperaturas – o clima muda rapidamente e é melhor estar preparado. Uma capa de chuva leve e uma sweatshirt são essenciais.
A minha maior preocupação é que o turismo crescente possa destruir o que torna Guarne especial. Já vi isto acontecer noutros lugares – a popularidade traz multidões, as multidões trazem problemas, e o que era autêntico torna-se comercializado.
Cada visitante tem o poder de influenciar positiva ou negativamente o futuro deste lugar. Se decidirem visitar Guarne, façam-no com respeito e consciência. Partilhem as vossas experiências, mas também a importância de preservar este pequeno paraíso verde.
Guarne provou-me que não precisamos de ir ao outro lado do mundo para encontrar natureza extraordinária. Às vezes o paraíso está a 45 minutos de distância, esperando que abrandemos o suficiente para o notar.
Sobre o autor: João dedica-se a partilhar experiências reais de viagem, dicas práticas e perspetivas únicas, esperando ajudar os leitores a planear viagens mais relaxantes e agradáveis. Conteúdo original, escrever não é fácil, se precisar de reimprimir, por favor note a fonte.